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quarta-feira, julho 03, 2002

Tudo bem, Uncool é morto-vivo.

E o morto-vivo não pode se conter após a leitura do texto abaixo. Depois de 11/9/2001, o debate político do nojo se moveu do "é imperialismo ou não" para "como exercer o imperialismo eficientemente"...

Vejam ao que estamos curvados (deu na revista Time):

O imperialismo americano está de volta à moda

Michael Elliot
Time Magazine

Se você é um nostálgico, do tipo que sente saudades de gin slings (a "caipirinha norte-americana", feita com gim), guarda-sóis e abanadores, o Jardim Rosado da Casa Branca seria o local perfeito na semana passada. O discurso do presidente Bush sobre o Oriente Médio poderia ter sido proferido por um governador colonial. Como se os palestinos fossem nativos miseráveis, Bush estabeleceu as condições que eles precisam atender antes de obterem a aprovação do Grande Pai Branco.

O imperialismo está novamente na moda. Com a estabilidade global ameaçada por Estados fracassados (ou quase-Estados) como o Afeganistão e a Palestina, a literatura sobre questões internacionais ficou subitamente cheia de artigos cujos autores parecem estar ecoando os pensamentos de Rudyard Kipling. "É chegado um novo momento imperial e, devido ao seu poder, os Estados Unidos estão destinados a desempenhar o papel de líderes", escreveu este ano, na "Foreign Affairs", o colunista do "Washington Post", Sebastian Mallaby. Em um novo livro que tem sido muito comentando, "The Savage Wars of Peace" ("As Selvagens Guerras da Paz") - o próprio título é tirado de uma passagem de Kipling - Max Boot, editor do "Wall Street Journal", argumenta que os Estados Unidos não devem temer se engajar em pequenas guerras para melhorar as condições de vida daqueles que vivem em terras menos felizes que as nossas. "Sim, há o perigo de que haja excesso de imperialismo e de confiança". E agora vem Bush, determinando, da mesma forma como o fizeram as potências coloniais de outrora, as providências que os palestinos devem tomar antes que os Estados Unidos reconheçam um Estado palestino: arranjem novos líderes, escrevam uma constituição, estabeleçam uma economia de mercado e outras exigências. Só faltaram a Bush uma peruca e um sotaque inglês acentuado.

Tudo isso é muito estranho.Os republicanos passaram oito anos criticando o governo Clinton pela sua mania neocolonial de construir nações em locais como a Bósnia, Somália e Haiti. Essa atitude, nos disseram os republicanos, se constituem em um desvio das missões principais dos Estados Unidos: defesa nacional e estabelecimento de um sistema de segurança global baseado nas relações com outras grandes potências. Na semana passada, no entanto, uma autoridade de alto escalão da Casa Branca afirmou alegremente, "Somos a favor da construção de nações, contanto que tropas norte-americanas não sejam utilizadas". (Uma afirmação que implora pela pergunta: Quem será utilizado?).

Os palestinos poderiam ser perdoados por pensar que os seus defeitos foram assinalados para que se tornassem o alvo de um tratamento grosseiro. Segundo Bush, a Palestina precisa de "uma nova constituição" e de reformas baseadas na "economia de mercado". É difícil argumentar contra tais assertivas, devido ao estado caótico da Autoridade Palestina. Mas Israel não possui uma constituição escrita e, durante décadas, possuiu uma das economias de maior caráter socialista fora do bloco soviético. Porém, não dá para lembrar de um presidente norte-americano que tenha exigido de Israel que fizesse reformas das suas leis trabalhistas antes de conceder ajuda econômica ao país.

Há mais do que uma simples questão de justiça nesta estória. Os Estados Unidos, como afirma Boot, possuem um bom registro como potência colonial. Porto Rico, a maior colônia norte-americana remanescente (o seu status é camuflado com o termo politicamente correto de commonwealth, mas não se enganem), é bem governado e próspero. Mas os Estados sábios não impõe aos outros condições que, durante muito tempo, causarão ressentimento. Os Estados Unidos estão certos em exigir que, qualquer que seja o Estado palestino, ele renuncie ao terrorismo, já que o terror é uma maldição que se derrama para além das fronteiras nacionais.

Da mesma forma, Washington tem o direito de dizer - conforme Bush o fez durante o encontro dos G-8, na semana passada, no Canadá - que a Palestina não obterá ajuda financeira norte-americana caso não reprima a corrupção. Aliás, não há problema em afirmar que uma economia de mercado tornará a Palestina mais próspera. Mas, e se os palestinos decidirem, devido à sua tolice, nacionalizar todas as plantações de oliveiras da Cisjordânia, por que é que alguém deveria se preocupar com isso? Por que tal gesto deveria ser um motivo para negar o reconhecimento a um Estado palestino?

Mas, o mais significante é a exigência de Bush por uma nova liderança palestina. Vamos supor que Iasser Arafat tenha sido desastroso para os palestinos. Por que alguém deveria pensar que os discursos de Bush tornem mais provável que o povo da região rejeite o seu líder? Desde a época de César Augusto, as potências imperiais tentam encontrar chefes locais com os quais possam fazer seus negócios. Isso nunca funciona. O fato de você assinar um tratado com Nuvem Vermelha não vai significar que Touro Sentado fique na reserva. Os movimentos de liberação nacional (e os palestinos acreditam que estão engajados em um desses movimentos) estão bem felizes, obrigado, em escolher os seus próprios líderes. Margaret Thatcher queria que o bispo Abel Muzorewa, um nacionalista moderado, liderasse um Zimbábue independente. Entretanto, a maioria dos zimbabuanos queria Robert Mugabe e, em 1980, o elegeram. Muzorewa poderia muito bem ter sido melhor para o Zimbábue do que Mugabe (dificilmente alguém poderia ser pior), mas o apoio de Thatcher certamente não ajudou o seu preferido.

Não há nada de errado com um pouco de colonialismo - que me desculpe a construção de nações - mas não é fácil exercita-lo da forma correta. Os norte-americanos deveriam se lembrar de que as antigas potências imperiais entraram em bancarrota em parte devido ao fato de nunca terem recebido agradecimentos das suas colônias pelo papel que desempenhavam. Ao contrário, o seu prêmio era "a repreensão daqueles que vocês ajudam, o ódio daqueles que vocês guardam". Trata-se, novamente, de uma passagem de Kipling. Ele é o homem do ano.

Tradução: Danilo Fonseca

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